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quinta-feira, 6 de março de 2014

"Seja forte" é o que eles dizem.
Ninguém pergunta se eu quero mesmo ser forte.
Depois de tanto, tudo que eu queria era ser fraca, bem pequenininha outra vez, pra caber nos seus braços, pra olhar aquele teu rosto de baixo, e não de cima. Pelo amor de Deus, não de cima. Eu sempre fui pequena, minha mão nunca deixou de caber na sua.
E por falar em mãos, eu quero agarrar o calor dos seus dedos, aquele que deixou na minha pele na quinta feira passada.
Nós somos tão parecidos, meu bom...
Nós, agora, somos um só.

terça-feira, 4 de março de 2014

Morrer em Hospital

Outra luz vermelha se acende no balcão da enfermaria
O enfermo precisa que levem a dor embora
Outra enfermeira vem pelo corredor raspando as coxas e arrastando os sapatos de pano, antes não tinha pressa, mas agora que gritam e choram, então acelera os passinhos lembrando então uma ave gorda e inóspita, sem poder nenhum sobre a vida alheia
O enfermo quer um travesseiro, o enfermo quer poder se deitar sem sentir um ácido corroer as costelas, os pulmões, o coração e o estômago. Quer conseguir dormir, quer poder comer -Não quer nada disso, quer que levem a dor embora e só.
Os que assistem ao nebuloso espetáculo da tortura é que querem o maldito travesseiro, mas a enfermeira quer ligar na "hotelaria"
Afinal a estadia em um hospital deveria ser confortável, mas não é, nunca foi.

Outra luz vermelha se acende no balcão da enfermaria
Quer levar a dor embora, quer chorar feito criança, quer abraçar, quer desfalecer em abraços conhecidos, quer que o desobediente braço cheio de agulhas se erga aos céus e quer que Deus exista, mas vê o diabo vestido de branco, vê a morte montada em um cavalo castanho, avista ao longe um chapéu de palha, uma, duas, três, quatro crianças nascendo, uma morrendo, e sente o toque de que já não se lembrava mais, algo muito humano, algo muito surreal.
Ah não... A vida e a morte, tudo deveria ser tão mais natural.
Vivemos nos envenenando, a gente morre com gente nos enganando.
"Logo logo tá em casa."
...
..
.
E não há, Oh mundo, não há mais nada que não me faça pensar em como os animais lidam melhor com a morte do que nós.
Os elefantes quando velhos caminham em direção à morte de forma natural e tão sábia, os gatos envenenados morrem em telhados distantes e assim segue a vida, uns caem por terra, outros nascem, nunca acaba.
Porém, como uma planta seca e retorcida, alterada, manipulada, presa em um vaso com suas raízes diminutas, morremos nós em quartos de hospitais, sem muito poder fazer, sem coragem de nos entregarmos, pois estamos entre estranhos, algemados cara a cara com o desconhecido, e então sofremos, e sofremos, sofremos até que a morte nos alcance, e até que a morte consiga beijar os lábios daqueles que tem canos ou máscaras enfiadas na cara e na boca, demora demais.

Ele dormiu numa manhã de sábado, depois de tanto cansaço.