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sábado, 22 de fevereiro de 2014

Deixa pra amanhã.

Eu que estou aqui, prostrada em meio ao nada, com tanta coisa pra fazer.
Eu que lamento a existência nos dias ímpares e celebro a vida nos pares.
Eu que perco a fé na humanidade, me entorpeço sozinha, me calo e deixo as coisas pra depois.
Eu que logo depois me recomponho e conserto meu mundo, pinto as paredes, cuido da saúde e me preocupo. Eu que não sei bem o que é que a vida pede, onde é que o vento sopra mais forte e porque é que as vezes tenho tanta sorte. Sorte ou falta dela, pois o improvável já esteve aqui tantas vezes.
Sento-me e espero que alguém me explique as fatalidades que não entendo, que o mundo me dê as coisas que eu não tenho, que o relógio e o calendário sintam pena dessa cara de domingo passado que fica por aqui embaixo dos meus olhos e nunca desaparece. Quem sabe a lua muda, eu volto atrás, quem sabe eu perdoo, quem sabe eu finalmente pego aquele voo e vou ver aquela menina que tanto quis conhecer.
Quem sabe eu deixo de ser tão presa no passado, quem sabe eu não começo a conhecer a mim mesma, pois olha só.. tudo que eu construí está guardado no armário, e todos os livros que eu li, agora já não me servem de muito.
Muito foi o que eu senti, talvez nem tanto pelas pessoas que por aqui passaram e decidiram então partir, mas talvez por mim. Sim, eu talvez seja egoísta, e egoísta pra caralho mas eu realmente senti muito.
E agora eu já não posso escalar, muito menos cair. Uma profundeza me aguarda cheia de sonhos e outra cheia de pesadelos, mas tenho um filho pra ter, e mais um monte daqueles mesmos livros pra ler.
 Amanhã passa, amanhã eu paro de deixar pra depois.

Chuvas de junho

Trazia no centro do lábio um corte finíssimo, embebido de sangue, como quem muito já mordeu a si mesma.
Aquelas mordidas distraidas em meio a aflições, o desconforto de não poder confiar nas próprias decisões, a vergonha escorrendo dos olhos.
Lágrima
Pinga
No
Corte
Da
Boca.
 Ah, pudera ter escolhido, ao menos entre a escuridão e o breu total.
Amarras me prendem dentro do meu próprio cárcere cheio de dúvidas
E aquele ano que já passou tão convicto e transbordando de mim, se transformando bruscamente em lembranças esfoladas de delicadezas não concedidas, sutilezas despercebidas e foi debaixo daquela chuva de junho, quando me apunhalastes enquanto beijava no meio da boca e entre os meus seios, e  a gritante magreza de quem morre sem fazer muito alarde, nossos ossos se roeram todos e eu desapareci assim, sem tanta manchete.
 É que eu nunca soube anunciar minha dor de maneira elegante, entende o que eu te digo?
 Elegante é a forma que você segura o cigarro e a forma como prende os cabelos, sendo esta também uma forma de anunciar a sua morte.

domingo, 16 de fevereiro de 2014

À minha criança:

Que a paciência não me falte nem mesmo nos momentos em que o sangue parece ferver em minhas veias.
Que eu saiba acolher teus medos e segurar tuas mãozinhas mesmo quando não couberem mais dentro das minhas.
 Que a vida seja sempre bonita pra nós, que onde quer que estejamos, eu nunca queira partir.
Que meu sustento te bote de pé, que a força de teus olhos sejam capazes de mover montanhas, e que eu nunca deixe de te mostrar o quanto o mundo pode ser cada vez melhor.
Que você sempre saiba que estarei aqui, por ti, e que as muralhas sejam tão menores que tua capacidade de sonhar.
E mesmo nos dias frios, mesmo nas noites assustadoras, eu vou te proteger de tudo, pois você me protegeu de mim.