Páginas

segunda-feira, 30 de setembro de 2013

Ninguém há de amar

Olhei-me no espelho e me senti agredida pelos (poucos) anos.
Prendi os cabelos, e olhei profundamente dentro dos meus próprios olhos. Não, não eram os anos. Os anos são coisas boas, a vida deve ser uma coisa boa. Uma coisa boa que desconheço.
Me senti então agredida por mim mesma, e toda a violência foi refletida nos braços, nas marcas, no sal dos olhos.
Quem há de amar aquela que se destruiu sem precisar de ajuda de ninguém?
Quem há de amar aquela que se restringe a diálogos monossílabos
E picota os cabelos todas as vezes que se sente triste
Quem há de amar aquela que se sente triste o dia inteiro?
Ah! as minhas faculdades. Minhas habilidades que se resumem em auto-destruição
Punição intensiva, pecadora assídua, vazia.

A chuva se derramava como um carinho ou lembrete de que a vida existe de verdade.
O estômago doía como um alarme de que eu deveria continuar viva.
A escuridão era uma outra porta, outra opção.
Vocês alguma vez já se sentiram como se não pertencessem ao lugar onde nasceram?

Ah, não, ninguém há de amar, nem a mim, nem ninguém
Todos hão de se vangloriar por conquistas que nem são de fato, mérito próprio.
E hão de destruir a terra que vos alimentam
E o mundo que suporta os nossos sapatos cederá
No lugar deste, uma enorme depressão se abrirá, quente como o diabo
Morreremos todos queimados pelos nossos próprios desejos sórdidos




Sempre achei que a pior dor era o aperto no peito.
Eu nunca tinha prestado tanta atenção no vazio. Foi então que percebi que o aperto é produto do nada.
Meu vazio que sempre enchi de futilidades até quase explodir, por isso, a pressão e a dor.
O vazio sozinho não dói. Zero vezes zero sempre será zero. Não importa quantas vezes eu erre na prova de matemática.
Mas e quando o vazio começa a ser questionado? E quando foi que permiti a mim mesma investigar as causas que me levaram a ser o que sou? Eu fugi tanto de psicólogos e psicanalistas. Eu sempre me entupi de remédios pra não precisar justificar nada. Eles sempre falaram por mim. Sempre dormiram e acordaram por mim. Nunca tive o trabalho de fechar os olhos e contar até dez, cem, mil, pra conseguir me acalmar. Ao contrário disso, sempre engoli dez pílulas, duzentos miligramas psicotrópicos e flutuei sobre o mar violento sem precisar nadar contra a correnteza. Exatamente, eu flutuava.
Nunca me veio a ideia de que o meu mar só fica bravo porque nunca lhe permiti a calmaria.
A verdade é que não sei onde encontrar a calmaria. Eu não sei muito bem do que gosto. Eu nem sei se sei gostar.
Agora o vazio é tão grande e preenche todo o nada. O vácuo do meu peito refletido no córtex esquerdo super-saturado.  
A solidão é tão clichê, me desculpem, eu nunca quis falar dela.
O desespero é tão comum, eu nunca quis poluir literatura com clichês, mas me desculpem, leitores, eu estou desesperada e completamente sozinha.

Acendo um cigarro vagabundo atrás de outro, tenho a impressão de que o mundo cheira mal.
Saudades eu sinto da serra de São Pedro, onde o aroma era fresco e as coisas cheiravam simplicidade e tudo era feliz. A rede, os peixinhos. (Acho que estou enlouquecendo)
Saudades do cheiro da tinta vermelha no cabelo e da tinta roxa na parede, saudades de quando eu conseguia abraçar as pessoas sem me sentir um incômodo, sem me sentir pedindo um favor. Eu detesto pedir favores.

Ah, me desculpem pela subjetividade.
Me desculpem por tudo.

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Romantismo de bituca queimada

Outra vez ergo a voz em um timbre falho e outra vez ao rodopiar a bailarina cai e esfola os joelhos.
Tinge de vermelho a meia-calça cor de rosa, sorri sem estar feliz, força os músculos da coxa e se levanta sem olhar pros lados. A dor assola a sola dos pés e continua sorrindo, as vezes, só rindo.
Rir de que? Rir por que? Rir pra quem, hora essa, um relógio parado no tempo sorri marcando dez pra uma da manhã.

Outra vez ergo o punho e ao cair o manto negro da madrugada você treme.
Treme, teme as bombas de gás de efeito moral devastando a visão de dois palmos a minha frente.
Moral- mortal- mordaz. Ácido corroendo retinas talvez nem tão inocentes assim.

Se eu pudesse, nunca teria reparado nos olhos da criatura de alma áspera e pele macia.
Amor maciço, amor de bituca queimada, que se fuma até o final, por desespero ou desesperança. 

Outro dia, outra saudade, outra desesperança, outra dor, outro cigarro é aceso sem a necessidade real de aliviar um vício. Outra vez ele chega ao fim, outra vez a fétida bituca cai ao chão.
Outra vez perco a direção dos olhos e perco a noção do tempo, e de novo, sinto vontade de destruir algo grandioso.

Ah, o romantismo de bituca queimada nunca me levou a lugar nenhum, nem nunca aliviou dor de alma ou de joelho, nunca... Apenas amarelou os dedos, os anos, os dentes.

Dentes que devoram amareladas paginas de pretérito imperfeito, por ter sido perfeito demais.
O tempo cura o joelho esfolado, dope tranquiliza o olho dilatado, mas nada, ninguém, e nem todos os cigarros apagados no cinzeiro do lado de fora da janela
Conseguem amenizar a falta que sinto dela.

segunda-feira, 16 de setembro de 2013

Quinto inverno no inferno

O segundo inverno só chega nas noites em que ele se faz quatro vezes ao ano e ninguém percebe
Ninguem percebe o frio que atinge a espinha nas manhãs de segunda-feira
Deus do céu, o diabo bate a minha porta de forma interrupta
E o céu está tao distante do que podemos ver
O paraíso é  a gente que cria
Se matassemos toda a gente desse lugar
Aí sim seria um bom lugar pra morar
Pois perdi a fé na humanidade no momento que morreu a reciprocidade
Se é que, de fato, um dia ela existiu.
Mas não nego que uma parte de mim morreu
No dia que você desistiu, partiu.
Se você de vez em quando lembrasse de mim
E na bagunça do teu quarto
Encontrasse aquele par de sapato
Que de proposito esqueci em tua casa
Quando me chamastes de anjo, arrancastes de mim uma asa
E agora, sem poder voar, vivo a procurar
um motivo que seja, pequeno, por que não?
Um pequeno motivo pra te odiar
De forma grandiosa, inescrupulosa, te odiar.
Te detestar pra ver se um dia desses
deixo de te amar
Quem sabe, querida, no quinto inverno?
Enquanto isso, vivo de paraíso em paraíso
Me drogando de poesia barata
Injetando heroína abstrata

Dor de junta

Era certo que as mãos doíam.
Nada se podia fazer a respeito, no entanto, gostaria muito que parasse de doer.                                        Uma mente barulhenta daquelas só se acalmava com uma caneta na mão, e a fricção da esfera azul-escuro se tornava um pouco mais grosseira a cada hora que passava, e como passavam rápido!
Da mesma forma, essa esfera azul também gira com demasiada pressa, e eu envelheço maldizendo os anos.

Certo dia, alguém me disse, que nesses dias cinzentos, desses invernos mal decididos, perdidos, desses que aproveitam uma corrente de ar qualquer e vem parar aqui perto da gente sem pedir licença e sem saber onde está. (Não se bate na porta de desconhecidos) Mas esse alguém me disse que nesses dias, parece que o tempo não passa.

Era ainda mais certo que o pescoço lhe doía.
E por que diabos era justo me doer o pescoço?
Eu preferia que dobrasse a dor nas juntas
Pra ver se junta tudo isso
E dói tudo que há de doer de uma vez só, sem ninguém precisar sentir dó.

Era certo que nada mais fazia sentido.

TEMPO

E é só quando os olhos ludibriam a mente que se torna possível enxergar com clareza as chagas pertinente a lassidão de uma alma pequena, esfolada e prostrada no chão.
É só ali, no chão de um quarto, esgadanhando com as afiadas unhas da mente a porta de madeira velha, turva, trancada, que se percebe o extremo da exaustidão de dezessete primaveras multiplicadas semi-abstratamente por um milhão de invernos.
Invernos estes que perderam a importância, a singela importância, desde quando a importância deixou de importar.
No lugar desta, foram colocadas um milhão de livros, um infinito de palavras escritas, alguns hematomas nos dedos e um constante esgotamento físico.
Não há mais tempo para acarinhar a pequena felina que implora por colo, não há mais tempo pra assistir ignobilmente a televisão junto a velha mãe, não há tempo para o por do sol e não há mais tempo pra poesia.
Não há tempo pra cuidar do corpo e do cabelo, nem mesmo da saúde, e tudo isso entristece, murcha, morre dentro de mim. Fecho o livro e fecho os olhos, sonho com poemas que não são meus.
Drummond, Meireles, Andrade.
Onde é que vocês, meus caros, arrumavam o tempo?
Pois agora o tempo passou e tranquilamente (ou não) vocês jazem abaixo dos meus pés, cansados pés.
E é só quando os pés latejam e os músculos doem que penso que talvez esse descanso nem sequer exista, e se existir, que coisa mais porca é essa do descanso divino ser embaixo da terra coberta de vermes?
Não há tempo para amar, e ouvi dizer que dessa vida só se leva o amor.
Não, não há tempo para janelas azuis, nuvens-de-algodão-doce.
Não há tempo de pensar, e pensando nisso entro em conflito existencial.
Ló-gi-ca.
Onde? Em mim? Não.
Nunca.
E na redundância do pleonasmo a vida segue e o relógio corre...
Sinceramente, perspícua e inegavelmente, não sei  bem por onde estou indo.
A porta (Ah, a velha porta) é estreita e o caminho é árduo, árido.
Não há água, só vinagre. Não há confiança, apenas dúvidas. Não há mais amizades, apenas corpos.
Corpos vazios, copos de vinho e o tempo a passar.
É só quando a garrafa chega ao fim que percebemos a falência do organismo inerte e corroído de álcool e hematomas. O álcool pra curar as feridas da alma, e a dor das feridas da alma pra desviar a atenção dos hematomas azulados que crescem de forma isômera abaixo de olhos opacos, retinas turvas e pupilas dilatadas, desgastadas, embaçadas.
Só aqui, já perdi tempo demais.




domingo, 8 de setembro de 2013

Peraí, meu bem, entendestes errado.
Tens mesmo essa mania de desfigurar a cara das frases com a sua arrogância e seu pessimismo, mas calma aí, meu bem, acende esse cigarro.
Flor do campo que foi meu, flor mais bonita de todos os campos, não murche.
Todas as outras vão murchar as seis da tarde, mas fique um pouco mais. É do teu perfume que falo.
Não, não me agrada essa sua dor, essa sua dor me machuca cada dia mais, por que é que não penteastes teus cabelos essa manhã?
Meu bem.. a cor de leite da tua pele azedou. Azedou, sim, morreu toda aquela coisa bonita, agora você tem os olhos sem direção, você entendeu errado....
Sempre entende errado. Olha: hoje de manhã um anjo colocou no céu um monte de algodão doce para que não fosse amargo teu dia. O que você faz? aperta pimenta vermelha entre os dedos finos e esfrega nos olhos pra não ver. Pra não ver que o dia é bonito, que a vida é bonita, ei, apaga esse cigarro, meu bem.
A fumaça embaça o espelho e te impede de ver sua própria beleza.
Ah, e que beleza rara, que beleza miúda, que doçura tua pequenez.
E aquele ego grande? e as grandes frases? onde foram parar, meu deus do céu, o que foi que você fez consigo mesma? Cadê a grande mulher que conheci naquela escada estreita?
Meu bem, minha querida, sei que não sabes, sei também que nunca mais direi, mas eu estou aqui por ti, e sempre estive, sempre estarei.
Não se esquece aquela flor que um dia perfumou sua vida.
Exala teu perfume, respira fundo, clareia a mente e segue em frente,
Segue sorrindo até o infinito, que teu sorriso é bom.

Eu nunca tinha reparado na grandeza da Lua.


Amor: subst. masc. 1. Afeição profunda a outrem, a ponto de estabelecer um vínculo afetivo intenso, capaz de doações próprias, até o sacrifício.



Nunca tinha reparado na grandeza da lua antes de ve-la surgir nos seus olhos e se despedir com o nascer do sol do teu sorriso de até logo.
Eu nunca tinha reparado na grandeza da lua, até a noite que eu fiquei pequenininha nos seus braços.
Estamos diante de uma enorme afronta aos românticos, astrólogos, físicos, religiosos ou meros observadores do céu: Eu nunca tinha reparado na grandeza da lua.
Eu nunca tinha estudado cinemática até sentir vontade de entender os movimentos do teu corpo, braços, pernas, quadril, piscar de olhos. Vetores do meu incomensurável desejo de estar perto.
Você, a quem escrevo, devo, não só total agradecimento por me fazer reparar nesse superno Luar acima de nós, como devo-te a imensidão de todo o céu, como única representação possível da quantidade de amor que nasceu em mim.
E por todas as luas que passaram e pelas que ainda hão de passar, digo, respiro fundo e grito:  AMO!
Seria eu merecedora do amor, ou pelo menos capaz de senti-lo?
Amor, pode representar qualquer coisa, principalmente hoje em dia, quando a futilidade toma conta dos dias e dos seres, mas tu, criatura, é a personificação do amor, aquele amor puro, aquele amor de verdade, talvez por ainda não ser. E por isso acredito que seja.
Não posso dizer que sei amar, mas posso aprender, se estamos nessa caminhada é pra aprender, assim como aprendi que torces o lado esquerdo do lábio quando fica brava.
Assim como aprendi a amar teu jeito de estar brava.
Assim como aprendi finalmente, que esse tempo todo fui apenas uma parte, jamais um todo de mim mesma. E estou aprendendo a me tornar plena e absolutamente tua, até mesmo antes de mim.
Afinal, quem serei se não do teu lado?
Outra vez ninguém, outra vez metade.
Hoje, amor, a Lua está tão bonita.