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quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Another bullshit

Diga a ele que você me viu
Que eu parecia muito bem
Apesar de tantas noites vazias
Tantas madrugadas vendo tv
Na verdade, dias intermináveis
Diga a ele que me viu num bar
E eu estava com umas amigas
Apesar de eu conhecer quem me rodeia
Tantos estranhos tão perto
Na verdade, longe do principal.
Diga a ele que me viu sozinha.
Diga que ele sabe onde eu estou
Diga a ele que me viu na rua
Que eu caminhava muito devagar
Que eu olhava para todos para enxergar
Tanto espaço dentro de mim
Na verdade, ele sabe quem eu sou.


Diga a ele que me viu crescer, que eu parecia tão melhor. Diga a ele que me viu estudar, diga que eu parecia tão importante. Diga a ele que, de vez em quando, eu ainda pareço tão inocente.


domingo, 23 de setembro de 2012

Setembro, de novo.

Eu sempre esqueço do dia, mas lembro do mês.



A gente mal se conhecia... Nos vimos apenas uma vez. Mas foi como a fotografia
de um velho filme francês.  Não fosse a roupa que eu vestia, naquele estilo new wave, quem sabe eu conseguiria chegar perto de você. Adolescência vazia..... Eu tinha quase 16. Ninguém me compreendia e eu não compreendia ninguém.
Fiquei ali sentada sobre as mãos, pensando em te perder.

O homem sem nome.

-Tem um isqueiro parceiro? -ela perguntou, enquanto lutava para por aquele irritante fio preto de cabelo atras da orelha, perguntou no mesmo tom alto que sempre utiliza, porém, no timbre baixo, deixando evidente em sua voz o desinteresse por aquela tarde de primavera tão frágil.
-Isqueiro? -A voz dele, assustada, foi quase cuspida de suas cordas vocais, como se tivesse entalada outrora antes. Os olhos rápidos era vivos, diferentes dos dela, e retirou com cuidado do bolso algo que ficou oculto em suas mãos velhas, cansadas. Ele ainda era jovem, não era moço, mas também não tão velho quanto suas mãos. Não tinha nome, apenas algumas tatuagens desbotadas e indecifráveis.
-Eu tenho bic.
Como acostumada a viver em meio a absurdos, ela já não pergunta, apenas surge uma pontinha de interesse naqueles olhos cor de areia, E para um homem acostumado a se comunicar por sinais, bem soube ele que teria alguém para contar sua história de quase vida.
Após acender o marlboro dela, o homem toma fôlego, olha para o céu. Falava rápido, parecia meio insano, meio interessante, meio morto, meio livre. Exatamente isso -Livre-
-Preste atenção no que eu te digo, moça, pois hoje -que dia é mesmo hoje?-
antes de responder a pergunta do até então desconhecido, ele se propôs novamente a falar, como se sua dúvida não passasse de uma pergunta retórica.
-Hoje eu saí da prisão.
Nós, não sabemos ao certo qual a reação que ele esperava, mas ela não deu um passo pra traz, nem agradeceu a brasa e se foi, apenas aguçou aquele interesse súbito que não se vê muito no rosto dela. E então, foi a primeira vez que ele deixou de lado o olhar irracional de um animal na jaula e os traços de sua feição pareceram.. Relaxar, e deu a impressão de que a muito tempo isso não acontecia.
A arqueadura de sua sobrancelha mudou, e agora, com os olhos calmos, pode continuar.
-Há doze anos atras, eu matei o estuprador da minha filha.
Então, a perturbadora sensação pareceu invadi-lo novamente, enquanto contava repetidas vezes seus códigos de guerra, As palavras proibidas, as chaves, os planos nunca vitoriosos, a dor, a solidão, a loucura. Vivendo por doze anos com animais ferozes, se tornando também um deles, pelo simples fato de ter matado um animal cruel.
 Sem saber como ajuda-lo, sem poder se envolver, Agradeceu com um rápido baixar de olhos e mover dos lábios, num quase sorriso, e foi-se embora. Deixou, por sua vez, o homem e sua liberdade, a morte e sua gratidão e o sangue na mão que não apertou.
O homem sem nome perdeu sua sanidade, liberdade e a sua criança, enquanto o estuprador, apenas perdeu a vida, suas ultimas palavras soaram como uma tentativa frustrada da reza tradicional, e agora me pergunto, o estuprador de fato de se arrependeu perante Deus e perante a morte, enquanto a pequena menina violada de nada teve culpa.
Eles estão no mesmo céu?
O estuprador e sua vítima.
Vocês são estúpidos.

segunda-feira, 17 de setembro de 2012

160 dias com você




Bonito demais, jovem demais para que esses dois adjetivos soem harmonicamente na mesma frase. (Portanto, alguns conflitos)
Ele prestava atenção em coisas que ninguém repara, ele é um artista e tudo que ele tem é o céu.


nona carta

18 de setembro
meia noite e meia
o telefone toca, estou ocupada, metade despida, metade vestida, carregando livros num só braço, aturdida.
Atendo, ou não?
Claro, claro que era você.
-Estava dormindo?
-Não, ainda não.
-É, achei mesmo que você ainda não tinha aprendido fazer isso.
.....
Silêncio. Coisas banais são ditas cortadas pelas entrelinhas da saudade que é tão evidente, decadente, monstruosa, porém, cada mês que se passa, um pouco mais omitida, é como se tivessem arrancado a estaca do meu peito e colocado no lugar apenas uma voz de uma paralela que se cruza lá em Curitiba.
(Longe, Longe, aqui do lado. Paradoxo. Nada nos separa...)
E então, eu ando estudando, meu bem. Por quê você não larga dessas bobagens e volta? Ou me deixa te visitar. Prometo que não pego tanto no seu pé, prometo que não vou lhe cobrar tanta atenção, objeção, não vou, só quero mesmo é lhe ver. Tento uma pequena poupança, ando pensando muito em entrar num avião, quem sabe, te encontrar?
E você me disse que não dava, que saía caro demais, que tá tudo distante demais, como é que se diz? "far away, baby"  Mas é cada coisa que me acontece! Olhe pra mim! estou me matando de estudar que é par...
-então você me corta a fala como quem corta uma garganta com uma navalha... Logo você, que nunca corta a fala de ninguém, tá sempre ali, esperando a pessoa terminar de falar, sem olhar nos olhos, sem deixar ninguém se certificar de que você está mesmo absorvendo tudo que é lhe dito, e eu, frenética, agora olhando no espelho, sentada no chão, tossindo, vermelha, e você diz que eu tô sempre me matando de alguma forma.
É verdade. Verdade mesmo. Mas de todas as formas você esteve aqui do meu lado, e agora, olhe só, que coisa mais impressionante-inacreditável-utópica. Estou mesmo careta e cafona, cercada por paredes pintadas e com as unhas intactas, fumando filtro branco, desdobrando as bainhas das mini-saias, cicatrizando as feridas. Que coisa mais engraçada, meu irmão.
Sinto sua falta até demais, você sabe me ler como quem lê  e entende um livro de Paulo Coelho, você consegue me interpretar mesmo quando minhas páginas estão amareladas e rasgadas, você sabe contar quantas lágrimas caem sem ao menos me ver.
Então você me manda embora, me empurra com as palavras, diz que vai atirar o telefone pela janela num dia desses,e eu fico aqui pensando a gente se despede, mas nunca desliga.





quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Cicatrizes e livros, futuro e passado.

Colocar o livro amarelado na escrivaninha, desligar a luminária, apagar o cigarro, aquecer os pés.
Ritual de todas as noites, fechar os olhos e imaginar o futuro.
Imaginar diálogos que nunca acontecem, me imaginar convivendo com gente que foi embora, pensar e repensar sobre o que eu deveria ter dito, ou o que eu deveria ter vestido, que horas eu deveria ter partido.
Desligar-me parcialmente da realidade e me encontrar inerte, sem expressão, com as pupilas dilatas pelo escuro e a iris vidrada pelo cansaço, e inerte continuo a pensar, pensar não em como será daqui cinco anos, mas criar uma linha paralela de outros cinco anos à frente.
Foi então, numa dessas noites que, antes de apagar a luminária, entrei quase num estado de alfa. O livro soltou-se dos meus dedos e minha mente foi se desligando enquanto as linhas que dividiam as quatrocentas páginas de biologia iam se embaralhando... e sumindo.
Não pensei então, em cinco anos à frente, mas à cinco anos atras.
Me vi sentada sob essa mesma cama, agora repleta de problemas à resolver, livros à ler, futuros à pensar. Me vi também no passado.  Vontade de segurar os ombros magros da garotinha loura e chacoalhar forte, eu entenderia, entenderia se alguém me dissesse, mas ninguém nunca me disse como é que ia ser.
Se alguém me contasse, eu tenho certeza, certeza de que não teria tantas cicatrizes nos meus braços.

terça-feira, 11 de setembro de 2012

Galeriscos e calor

Não foi o relógio atrasado que me deixou triste. Dessa vez, nem foi tanto o barulho. A vizinha impertinente falava coisas desnecessárias para mim, enquanto aflita, levava o pulso bem perto da cara seguidas vezes, míope maldita que eu sou, havia largado os óculos em casa quando saí no desespero de te encontrar.
Não foi o calor, o sol queimando a pele, a roupa preta quente, não foi os olhares, nem foi nada disso que me mata todos os dias, o que me matou foi não te ver.
E me pego pensando, será que você ainda lê isso? As coisas que nunca direi em voz alta. E fico te imaginando, no seu quarto, vestida três vezes mais que o necessário, rindo de mentira, com os cabelos presos formando uma pequena cascata atras da sua cabeça, e tento adivinhar, o que é que se passa nessa cabeça?! Meu deus, olhe no que eu me transformei. Novamente são três da manhã.
Acho que três da manhã é sua hora, será?
Não sei se ainda faz sentido o que eu falo.
Lembro dos teus olhos, eu vi galerias nesses olhos, uma galeria de quatorze andares e completamente iluminada, ela fica em alguma cidade que ainda não existe, e nessa cidade só faz noite.
Na verdade ele fica mesmo nos seus olhos e pronto.